📌À descoberta da antiga fortaleza portuguesa de Mazagão (1506-1769): um olhar fotográfico…

Mazagão (El Jadida, Marrocos) não é uma fortaleza como tantas outras. É a jóia do património edificado militar do Império Português (1415-1769) no Magrebe. As suas pedras contam muitas estórias da História de Portugal.

panorama-citeportuguesa_eljadida

A cidade-fortaleza de Mazagão, oficialmente fundada como vila a 1 de Agosto de 1541, apesar da existência de uma pequena fortaleza construída pelo arquitecto Diogo de Arruda, em 1514, actual Cisterna Portuguesa, como ponto de apoio a Azamor. Mais tarde, em 1541, João de Castilho adaptaria para uma cisterna e celeiros. Foi desenhada pelo engenheiro italiano Benedetto da Ravenna, em conjunto com Miguel de Arruda e Diogo de Torralva. De referir, que a construção desta fortificação marca o inicio da adaptação das novas formas de combate no Magrebe – construções com baluartes de traça italiana -, em virtude pela utilização da artilharia por parte das forças islâmicas. A partir da 2ª Metade do Século XVI dá-se a adaptação das velhas fortificações de cariz medieval para esta nova arquitectura militar.

el-jadida-14

O seu porto de acesso fácil e a traça abaluartada das muralhas, em alguns pontos com mais de dez metros de espessura, tornavam-na numa inexpugnável. Mais tarde, seria abandonada por Portugal, em 1769, por decisão do «valido» do Rei D.José I, o então Marquês de Pombal. Actualmente, a Cité Portugaise de El-Jadida está restaurada, como se comprova pelas fotos da minha autoria. A enorme extensão do perímetro muralhado da antiga Mazagão mostram a tradição da arquitectura militar italiana e da importância do estilo renascentista durante o Reinado de D.João III (1521-1557). De Salientar que o Baluarte de São Sebastião, lado do mar, mostra a escala grandiosa da fortificação.

marrocos-2013-435

A famosa cisterna da antiga Mazagão é uma das atracções turísticas de Marrocos. Foi construída sob a direcção de João de Castilho em estilo renascentista sobre o pátio de armas do antigo Castelo de origem Manuelina. O catalisador da construção desta imponente fortificação militar foram os constantes raides, razias e conquistas dos xarifes do Sul de Marrocos, equipados com moderna tecnologia pirobalística e com conselheiros militares europeus (mercenários italianos/germânicos). Mazagão era, assim, uma alternativa viável ao abandono das possessões costeiras fortificadas de Santa Cruz do Cabo Gué (Agadir), Safim e Azamor. A concentração de meios humanos, materiais e bélicos numa única praça permitia uma melhor resistência aos constantes e numerosos assédios das forças sob o signo de Alá.

marrocos-2013-478

Em 1769, a cidade-fortaleza de Mazagão foi abandonada pela Coroa Portuguesa. Em virtude deste abandono, a Coroa ordenou que os seus habitantes – nobreza local, soldados, etc – fossem para Lisboa. Aqui chegados, foram reenviados para uma nova missão: a fundação de uma Nova Mazagão, na fronteira Norte do Brasil, no actual estado de Amapá. Era o fim de mais de três séculos de presença portuguesa em Marrocos (1415-1769), em virtude de as possessões norte-africanas serem um sorvedouro de recursos humanos, monetários e bélicos, sem qualquer retorno (à excepção das questões ideológicas, Guerra Santa).

marrocos-2013-469

A antiga fortificação de Mazagão constitui – hoje uma importante atracção turística de Marrocos – um dos melhores exemplos conservados da arquitectura militar do Renascimento fora do Continente Europeu, que resistiu ao teste do tempo e da própria acção humana. De Salientar, que as fortificações portuguesas de Mazagão foram inscritas na lista do Património da Humanidade pela UNESCO em 2004 e, em 2009, como uma das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo. O litoral atlântico de Marrocos oferece-nos uma grande variedade de grandes e pequenas fortificações costeiras com grande impacto visual e plástico, como em nenhum outro lugar. Nas mesmas, podemos encontrar o estilo de fortificar de Diogo de Arruda e dos seus familiares.

panorama-eljadidaescala

A opinião do viajante. A região do Norte de África (Magrebe)  – Marrocos – não é para um português um mero passeio como qualquer outro.  É uma espécie de regresso a casa. Para quem possua alguns conhecimentos de Geografia e História e tenha o sentido do valor dos passado lusitano, visitar o actual Reino de Marrocos é ir a um dos nossos lugares predilectos, ir afervorar o amor pátrio e retemperar a alma, como afirma Urbano Rodrigues (RODRIGUES, 1935). De facto, diante de património edificado pelos nossos antepassados  em diversas cidades costeiras como Asilah, Tânger, Essaouira, Safi, El Jadida, podemos sentir bem o que fomos e o que podemos ainda ser. Infelizmente, não cultivamos o maior legado português ao Mundo: a língua portuguesa!

eljadidacanhoes

BIBLIOGRAFIA

Impressões de uma visita de estudo a Marrocos – As Fortificações de origem portuguesa 

Carita, Rui, “A arquitectura abaluartada de origem portuguesa”, in Relações luso-marroquinas 230 anos, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, nº 17-18, Lisboa, Instituto Camões, Novembro 2004, pp. 135-138, 143-145.

Correia, Jorge, “Mazagão: A última praça Portuguesa no Norte de África”, in Revista de História da Arte, Lisboa, IHA – FCSH-UNL, nº 4 , 2007, pp. 185-209.

Dias Farinha, António,  “Os Portugueses em Marrocos”, Instituto Camões, Colecção Lazúli, 1999,pp.3-103.

LOPES, David – A Expansão em Marrocos, Colecção Cabo a Cabo, Lisboa: Teorema /O Jornal, 1989.

Moreira, Rafael, “Arquitectura militar do Renascimento”, in História das Fortificações Portuguesas no Mundo, Dir. Rafael Moreira, Lisboa, Pub. Alfa S.A., 1989, pp. 150-157.

Moreira, R. (2021). O tesouro de Mazagão. In M. A. L. Cruz, & A. Teixeira (Eds.), Portugal e o Sul de Marrocos: contactos e confrontos (séculos XV-XVIII). Vol. I – Estudos (Vol. 1, pp. 359-375). (Colecção Arqueoarte; No. 2). CHAM – Centro de Humanidades / Laboratório de Paisagens, Património e Território​ (Lab2PT) – Universidade do Minho. http://hdl.handle.net/10362/131066

RODRIGUES, Urbano – Passeio a Marrocos, Lisboa: Empresa Nacional de Publicidade, 1935.

Nota importante [👤]

As presentes informações não têm natureza vinculativa, funcionam apenas como indicações, dicas e conselhos, e são susceptíveis de alteração a qualquer momento. O Blogue OLIRAF não poderá ser responsabilizado pelos danos ou prejuízos em pessoas e/ou bens daí advenientes. Se quiser partilhar ou divulgar as minhas fotografias, poderá fazê-lo desde que mencione os direitos morais e de autor das mesmas.

linhagraficaALL-oliraf-03💻  Texto: Rafael Oliveira 🌎 Fotografia: Oliraf Fotografia 📷

Follow me: @oliraffotografia on Instagram | Oliraf Fotografia on Facebook

Fotografia✈︎Viagens✈︎Portugal © OLIRAF (2015)

📩 Contact: oliraf89@gmail.com 

📷 Roteiro fotográfico pelo Reino de Marrocos…

🌏Viajar é uma experiência pessoal. Há oportunidades que nunca se devem desperdiçar. Concordo. Marrocos era um sonho e fui torná-lo em algo palpável para mim. E como tinha curiosidade, decidi não desperdiçar a oportunidade de me juntar à 5.ªViagem de Estudo ao Reino de Marrocos, que decorreu entre 25 de Março a 2 de Abril de 2015, organizada pelo Departamento de Geografia e Planeamento Regional (DGPR) e aberta a toda a comunidade académica da FCSH/NOVA, antigos alunos e demais convidados. Porque, para mim, o verbo Ir é o melhor remédio terapêutico…
BlogOLIRAF
Ao longo desta viagem, obtive conhecimento científico, momentos de aprendizagem e enriquecimento pessoal,tais como, a observação de grandes formações rochosas, paisagens, formas de ocupação humana e o património edificado de origem portuguesa. As visitas de estudo ou os programas de voluntariado são uma excelente forma de conhecer locais de Portugal ou no Estrangeiro com um grupo de académicos/amigos que nos proporcionam trocas de experiências pessoais, académicas e profissionais.  E, claro, é uma forma “barata” de viajar. Apesar do pouco tempo que temos para contemplar e apreciar os locais em que se para ao longo dos trajectos, é uma boa forma de promover o contacto com o “outro”.
valedodraa2015
Esta viagem a  Marrocos proporcionou-me o contacto com lugares exóticos incríveis, com habitantes genuínos, com paisagens em constante mutação a cada quilómetro, a cidades fantásticas, com património de oriegem portuguesa e o contacto com a civlização muçulmana.  Locais como a Mesqueita de Koutoubia em Marraquexe, a fortaleza de El-Jadida,  a Skala du Port de Essaouira,  as ruinas romanas de Volubilis, das ruelas  azuis de Chefchaouen, a Ksar de Aït Benhaddou em Ouarzazate, de todo o ambiente da Praça Jemaa El-Fnaa e, claro, das Dunas de Erg Chebbi no Deserto do Saara.
subindoatlas
No Total, foram nove dias de viagem com 3270 km de autocarro que me permitiu partir em busca da essência de África, das suas gentes, paisagens, da sua cultura, experiências e memórias de um pais africano, de origem muçulmana sunita,  com uma extensão territorial quase cinco vezes superior à de Portugal e com 30 milhões de Habitantes.

📌Dia 1 – 25 Março  de 2015: Lisboa / Tânger (via Algeciras)

gibraltar2015
Vista parcial do rochedo de Gibraltar

Tendo o Estreito de Gibraltar como pano de fundo, após a saída do ferry-boat do complexo portuário de Algeciras, o porto da cidade de Tânger emerge sumptuosa num ponto fulcral do continente africano, onde inúmeras civilizações, culturas e povos que ali se cruzam durante milénios. Em menos de uma hora de viagem, estamos noutro continente: o africano.

tangermedporto
Vista parcial do Porto Internacional de Tânger

📌Dia 2 – 26 Março  de 2015:  Tânger / Meknes

chefchaouen2015
Cidade de Chefchaouen: o azul do céu e do casario azul

Rumo a Meknes, com paragens por Chefchaouen e Volubilis. Chefchaouen  presenteia-nos com as suas cores azuis turquesa na maioria das suas casas e na antiga medina. De facto, é uma cidade muito fotogénica. Para quem vem da Europa, na minha opinião, esta é a cidade ideal para se ambientar nas ruelas de Marrocos e para aqueles que querem explorar as Montanhas do Rife. De seguida, as ruínas romanas de Volubilis (UNESCO World Heritage) não são só uma cidade em si, é também a paisagem que a circunda. Uma cidade antiga que só se pode  compreender o seu valor patrimonial e arqueológico pela sua importância no contexto paisagístico.

archaeological-site-of-volubilis
Ruínas Romanas de Volubilis

📌 Dia 3 – 27 Março – Meknes / Merzouga

palhaneveifrane

Já imaginaram pisar neve e a areia do deserto no mesmo dia? Sim, foi possível no trajecto entre a cidade Imperial de Meknes ( que infelizmente só percorri as ruelas da medina à noite). Ao longo deste trajecto até Merzouga percorremos inúmeras aldeias, vilas e cidades de Marrocos, com paisagens de cortar a respiração e locais isolados longe de qualquer lugar.  Todavia, o melhor estava guardado para ao fim: a viagem 4×4 até Merzouga.

errachidia-%d8%a7%d9%84%d8%b1%d8%b4%d9%8a%d8%af%d9%8a%d8%a9

📌Dia 4 – 28 Março – Merzouga / Zagora

desertoshaaramerzougacamelosEm Merzouga, a aldeia das dunas, a paisagem fica reduzida a duas cores: o castanho-avermelhado das areias e o azul do céu. É um pequeno oásis sariano próximo das Dunas de Erg Chebbi. Estas imponentes Dunas são as mais espectaculares de Marrocos. Situada na zona sudeste, a sul de Erfoud, perto da fronteira da Argélia, são também muitas vezes chamadas de Dunas de Merzouga. Este  “mar” de areia tem as dunas mais altas de Marrocos, chegando a atingir  quase os 250m de altitude. merzouga2015erbchebbidunas

📌Dia 5 – 29 Março – Zagora / Marrakesh

valedodraapalmeiral
Vale do Draa (Zagora)

Partida de Zagora, com o Vale do Draa ao fundo, rumo à cidade imperial de Marraquexe. Pelo meio a subida do Alto Atlas com paragem no Col du Tichka (a 2260metros de altitude), uma visita ao Ksar de Ait-Ben-Haddou (Ouarzazate) – African World Heritage (UNESCO) – e, finalmente, apreciar um magnifico “sunset” e uma noitada na praça mais animada de África: a Jemaa El-Fnaa.

ksariatbenhaidoiun
Ksar de Ait-Ben-Haddou (Ouarzazate)

📌Dia 6 – 30 Março – Marrakesh / Marrakesh

marrocos2015-1135
Jemaa El-Fnaa

A cidade de ocre: Marraquexe. Aqui, chegamos à verdadeira essência de Marrocos. Passei o tempo a deambular pelas ruelas do “enorme” Souk e antiga medina de Marraquexe, uma visita à farmácie berbere, pela antiga escola corânica Medersa Ben Youssef, Mesquita de Koutoubia, Praça Jemaa El-Fnaa e finalmente, a visita aos jardins da casa do pintor francês Jacques Majorelle (1886-1962) e ao museu berbere no seu interior. Este último, recomendo.

marrocos2015-985
Arquitectura Urbana de Marraquexe

📌Dia 7 – 31 Março – Marrakesh / El-Jadida

essaouiraportobarcosfaina
Porto de Essaouira

Os Portugueses que, de 1415 a 1550, erigiram em solo marroquino as fortalezas que hoje são o nosso testemunho nestas latitudes. Para as gentes do Magrebe, os nossos antepassados não eram estranhos..De facto, os muçulmanos ou “mouros” estiveram quase cinco séculos e meio no território que hoje é Portugal (Gharb Al-Andalus). No fundo, somos duas faces de uma mesma moeda.

panorama-eljadidaescala
Baluartes e muralhas de El Jadida: a antiga fortaleza portuguesa de Mazagão

📌Dia 8 – 1 Abril – El-Jadida (Via Tânger)/ Cadiz

asilah_porta_babalhomar
Centro Histórico de Arzila

Os últimos dois dias da viagem foram efectuados junto à zona litoral do Marrocos Atlântico, onde podemos visitar inúmeras cidades com património de origem portuguesa, tais como, Esaouira, Safi, El-Jadida e Arzila. Na minha opinião, as mais interessantes são Essaouira – pela cidade em si – e El-Jadida pelo património arquitectónico-militar lusitano edificado.

asilahstreets
Arquitectura Urbana de Arzila

📷Este Roteiro Fotográfico pelo Reino de Marrocos permitiu-me deambular e divagar por lugares exóticos incríveis, cheios de belezas naturais, cidades imperiais fantásticas ou  o contacto com o  património de origem portuguesa. Apesar de ser um país que está tão perto de Portugal, as pessoas ainda têm algum desconhecimento e receio de vir até cá.

essaouiramarrocos

O custo para os participantes desta viagem de estudo rondou os 650 euros, sem contar com as despesas extras, por exemplo, as famosas compras no Souk de Marraquexe ou na farmácia Berbere.  De referir, que o preço incluiu a viagem em autocarro de turismo, a viagem de ferry (Algeciras/Tânger e Tânger/Algeciras), hotel (com pequeno almoço e jantar) e seguro de viagem, pelo que a única despesa diária não incluída era o almoço. Já lá queria ter ido há algum tempo.

argantreecabrassuz

O caminho faz-se geografando. O supremo modo de viajar ė a caminhada. Infelizmente, a urgência dos tempos modernos só esporadicamente deixa experimentar esta sensação. Decidi-me de uma vez por todas cumprir desejos. Marrocos foi o primeiro.Nesta reportagem fotográfica aparece apenas uma pequena fracção do que vi, conheci e vivi…

soulerfoudrissani

P.S: em certos momentos, o passaporte é a sua prova de vida, guarde-o num sitio seguro. Se for a Marrocos, o leitor terá de possuir um passaporte com validade superior a 90 dias a contar da data de entrada no Reino de Marrocos.

👤 Nota importante

As presentes informações não têm natureza vinculativa, funcionam apenas como indicações, dicas e conselhos, e são susceptíveis de alteração a qualquer momento. O Blogue OLIRAF não poderá ser responsabilizado pelos danos ou prejuízos em pessoas e/ou bens daí advenientes. Se quiser partilhar ou divulgar as minhas fotografias, poderá fazê-lo desde que mencione os direitos morais e de autor das mesmas.

linhagraficaALL-oliraf-03

Texto: Rafael Oliveira  | Fotografia: Oliraf Fotografia

Follow me: @oliraffotografia on Instagram | Oliraf Fotografia on Facebook

Fotografia•Viagens•Portugal © OLIRAF (2015)

Contact: oliraf89@gmail.com

 

📷 Roteiro Fotográfico pelas fortificações de origem portuguesa em Marrocos…

Salaam alaikum…

No contexto da 5ª visita de estudo ao Reino de Marrocos, organizada pelo Departamento de Geografia e Planeamento Regional da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, tive a oportunidade de conhecer, estudar e fotografar inúmeros locais de Marrocos.

panorama-citeportuguesa_eljadida
Panorâmica da Fortaleza de Mazagão

Foram, no total, nove dias de viagem com 3270 km de autocarro que me permitiu partir em busca da essência de África, das suas gentes, paisagens, da sua cultura, experiências e memórias de um pais africano com uma extensão territorial quase cinco vezes superior à de Portugal e com 30 milhões de Habitantes. Todavia, o percurso pelo litoral atlântico de Marrocos permitiu-me contactar com alguns lugares com vestígios da arquitectura militar de origem portuguesa, nomeadamente, Essaouira, Safi, El Jadida e Asilah.. De facto, esta viagem permitiu-me elucidar que Portugal e Marrocos partilham legados culturais e interesses comuns. Aliás, a nossa História cruzou-se por várias vezes com este continente…Somos Países Vizinhos!

Após mais de 600 km de estrada entre Lisboa e Algeciras, pelo meio a travessia do Estreito de Gibraltar, cheguei a Marrocos (Tânger). Em linha recta, capital mais próxima do Reino de Marrocos (Rabat) é Lisboa. Marrocos é um pais com mais de 446 mil Km2 de área, com 2500 km de costa atlântica de extensão e 300 km de costa Mediterrânica. Na minha opinião, descobrir este Reino é quase como reviver memórias de outros tempos, uma espécie de regresso a casa.

A ver pela sua História, Marrocos e Portugal partilham em comum uma herança civilizacional e cultural que sempre me fascinou, apesar das diferenças religiosas. Tal como nas moedas, coexistem duas faces distintas mas com um elo inseparável entre si.

O Norte de África, em especial Marrocos, à época chamava-se Reino de Fez (Merínidas), foi a primeira tentação de um Portugal sedento de afirmação internacional e em busca de grandeza, após Aljubarrota. A presença portuguesa em Marrocos durou mais de trezentos anos (1415-1769). Como se sabe, aventura dos Descobrimentos Portugueses iniciou-se a 14 de Agosto de 1415, quando uma armada de 200 navios, 50 mil homens, um rei D.João I (e três príncipes, D.Duarte, D.Pedro e D.Henrique) tomaram a cidade portuária de Ceuta.

Ao longo do litoral norte africano – mediterrâneo e atlântico -, os portugueses conquistaram e construíram inúmeras fortificações. São exemplos, Ceuta (1415-1668), Alcácer-Ceguer (1458-1550), Tânger (1471-1662), Arzila (1471-1550; 1577-1589),Safim (1488-1541), Aguz (1506-1525),Mogador (1506-1526), Azamor (1513-1541), Santa Cruz do Cabo de Guê (1505-1541) e Mazagão (1506-1769).

A maioria das fortificações construídas pelos portugueses foi no período de conquistas lusitanas no litoral norte-africano (séc. XV e XVI). Segundo o Historiador Rafael Moreira, in História das Fortificações Portuguesas no Mundo, Marrocos durante a 1ªMetade do Século XVI era um campo de experimentação das inovações, ensaios e soluções da arquitectura militar fora do continente europeu.

As fortalezas portuguesas existentes no Norte de África, ao longo da costa atlântica de Marrocos, atestam o plano da Dinastia de Avis de as tornar praças de guerra. Desde a conquista de Ceuta (1415) até ao Desastre de Mamora (1515), o palco principal das ambições e decisões políticas da monarquia portuguesa é o Norte de África. De facto, as possessões portuguesas em Marrocos eram praças de guerra. As suas muralhas conservadas até hoje, algumas em ruinas, atestam a sua solidez e as ambições do Venturoso era tornar a costa marroquina numa couraça de praças-fortes que ia desgastando os adversários e o obrigariam a render-se.

O objectivo das autoridades portuguesas ao longo dos séculos que estiveram presentes em Marrocos eram as questões bélicas, ideológicas, politicas e comerciais. O controlo dos principais portos marroquinos, tendo em vista, a neutralização da pirataria – defesa das embarcações do Império Português -, a realização de actividades comerciais com as autoridades locais (cavalos, tecidos, arroz,etc), a necessidade de um território para manter a nobreza ocupada longe de querelas internas e externas e, finalmente, a promoção da Guerra Santa contra os Infiéis para afirmação da Dinastia de Avis junto do Papado. De referir, que a Nobreza Portuguesa considerava Marrocos vital para o prestigio e reputação pela força das armas, sendo essencial a sua manutenção sob égide das forças portuguesas.

O fim do ciclo português em Marrocos ocorreu com o abandono do último bastião fortificado: a praça-forte de Mazagão em 1769. Actualmente, este património militar está em óptimo estado de conservação e manutenção graças ao apoio das autoridades marroquinas e fundações privadas portuguesas, por exemplo, a Fundação Calouste Gulbenkian.

Actualmente, este património militar está em óptimo estado de conservação e manutenção graças ao apoio das autoridades marroquinas e fundações privadas portuguesas, por exemplo, a Fundação Calouste Gulbenkian.

Ao longo desta aventura em Marrocos, acompanha-me um profundo conhecimento do legado lusitano nestas paragens. Aqui penso que foi aqui que Portugal construiu e iniciou a sua epopeia além-mar, sentindo um pouco da nossa alma ligada às pedras, aos baluartes, as muralhas, as ruas que foram levantadas com tanto esforço e orgulho, à custa de sangue lusitano!

📌Fortaleza de Arzila (1471-1550; 1577-1589)

marrocos-2013-032

A Fortaleza de Arzila constitui um belo exemplar da fortificação manuelina. Fica situada num pitoresco porto de mar, entre Larache e Tânger, no Garbe Marroquino. O Baluarte de São Francisco (em primeiro plano) e Baluarte da Pata de Aranha, ao fundo, destinavam-se a bater com fogo cruzado o ancoradouro do melhor porto do litoral marroquino até Mazagão.

asilah_torremenagemmedieval_borj-al-kamra

A Torre de Menagem de Arzila é uma típica estrutura feudal. Foi erguida, em 1509, pelo arquitecto-mor do Reino, Diogo Boytac, durante o intervalo à frente do Mosteiro dos Jerónimos. Segundo a tradição, terá sido nesta torre que terá pernoitado o rei D.Sebastião antes da fatídica Batalha de Alcácer-Quibir.

marrocos-1

 

📌Fortaleza de Safim (1488-1541)

castelomarsafipb

Situada no Marrocos Atlântico, entre Essaouira e El Jadida, Safim (Safi) foi um importante porto atlântico durante a 1ªmetade do Século XVI para o projecto imperial  marroquino da Coroa Portuguesa. Desde 1491, que os Portugueses mantinham uma pequena feitoria fortificada para as transacções comerciais com os habitantes locais e tribos berberes. Também era um importante centro produtor de alambéis (tapetes coloridos) que eram essenciais nas trocas comerciais com as tribos africanos da região da Fortaleza de São Jorge da Mina (no actual Gana).

marrocos-1-5

Em virtude da necessidade de defesa da mesma, em 1516, a Coroa ordenou a construção de uma fortificação, de origem manuelina, o conhecido Castelo do Mar. Foi recentemente restaurado pelo Serviço dos Monumentos Históricos de Marrocos, fazendo jus a uma das fortificações manuelinas mais grandiosas e mais bem conservadas do continente africano. De referir, que o Nuno Fernandes de Ataíde, capitão desta praça africana entre 1510 a 1516, ficou com a alcunha do «Nunca está Quedo», em virtude de ter sido um homem de acção – irrequieto e voluntarista – durante as constantes surtidas na região.

safim-4

O perímetro amuralhado desta cidade do litoral marroquino é de origem manuelina, sendo erguidas em 1511 pelo arquitecto Diogo de Arruda. Tive oportunidade de constatar a sua vastidão, grandeza e estado impecável de conservação. De Salientar, que a Torre de Menagem de Arzila e o Castelo do Mar de Safim são as únicas estruturas arquitectónicas de traça medieval que subsistem no continente africano construídas pelos portugueses.

📌Castelo de Aguz (1506-1525)

marrocos-1-3

O Castelo de Aguz (Souira Kedima) foi construído em 1519 na foz do rio Tensift, a 35 km a sul da cidade de Safi. Era uma base de apoio táctico ao porto atlântico e fortaleza de Safi. Encontramos semelhanças, na sua arquitetura militar, no castelo roqueiro de Vila Viçosa e as ruinas do antigo Palácio dos Alcaides de Torres Vedras, com um pátio central e torreões ultra-circulares nos ângulos. Trata-se de um exemplar da fortificação costeira manuelina simplificada.

📌Antiga Mogador (1506-1526)

essaouira-3

A cidade portuária de Essaouira, situada entre Safi e El Jadida, foi no Século XVI uma antiga possessão portuguesa denominada de Mogador (1506-1526). O Castelo de Mogador, construído em 1506, por Diogo de Azambuja, já não existe. Esta fortificação, segundo fontes, durante o curto período nas mãos lusitanas, era dependente das provisões com origem na Ilha da Madeira, nomeadamente, o vinho, azeite, trigo ou madeira.

marrocos-2013-302

Se visitarmos a medina, as muralhas e o porto da «cidade do vento» podemos constatar a antiga presença lusitana, apesar das actuais fortificações, de origem marroquina, terem sido construídas durante o Século XVIII por ordem do sultão alauita Bem Abbala, quando pretendeu fazer deste local um importante porto exportador do ouro trazido pelas caravanas atravessavam o Saara desde Tombuctu (Mali).

marrocos45

📌Fortaleza Mazagão (1506-1769)

marrocos-2013-444

A Cidade-fortaleza de Mazagão, oficialmente fundada como vila a 1 de Agosto de 1541, apesar da existência de uma pequena fortaleza construída pelo arquitecto Diogo de Arruda, em 1514, actual Cisterna Portuguesa, como ponto de apoio a Azamor. Mais tarde, em 1541, João de Castilho adaptaria para uma cisterna e celeiros. Foi desenhada pelo engenheiro italiano Benedetto da Ravenna, em conjunto com Miguel de Arruda e Diogo de Torralva. De referir, que a construção desta fortificação marca o inicio da adaptação das novas formas de combate no Magrebe – construções com baluartes de traça italiana -, em virtude pela utilização da artilharia por parte das forças islâmicas. A partir da 2ª Metade do Século XVI dá-se a adaptação das velhas fortificações de cariz medieval para esta nova arquitectura militar.

el-jadida-14

 O seu porto de acesso fácil e a traça abaluartada das muralhas, em alguns pontos com mais de dez metros de espessura, tornavam-na numa inexpugnável. Mais tarde, seria abandonada por Portugal, em 1769, por decisão do «valido» do Rei D.José I, o então Marquês de Pombal. Actualmente, a Cité Portugaise de El-Jadida está restaurada, como se comprova pelas fotos da minha autoria. A enorme extensão do perímetro muralhado da antiga Mazagão mostram a tradição da arquitectura militar italiana e da importância do estilo renascentista durante o Reinado de D.João III (1521-1557). De Salientar que o Baluarte de São Sebastião, lado do mar, mostra a escala grandiosa da fortificação.

marrocos-2013-435

A famosa cisterna da antiga Mazagão é uma das atracções turísticas de Marrocos. Foi construída sob a direcção de João de Castilho em estilo renascentista sobre o pátio de armas do antigo Castelo de origem Manuelina. O catalisador da construção desta imponente fortificação militar foram os constantes raides e conquistadas dos xarifes do Sul de Marrocos, equipados com moderna tecnologia pirobalística e com conselheiros militares europeus (mercenários italianos/germânicos). Mazagão era, assim, uma alternativa viável ao abandono das possessões costeiras fortificadas de Santa Cruz do Cabo Gué (Agadir), Safim e Azamor. A concentração de meios humanos, materiais e bélicos numa única praça permitia uma melhor resistência aos constantes e numerosos assédios das forças sob o signo de Alá.

marrocos-2013-478

Em 1769, a cidade-fortaleza de Mazagão foi abandonada pela Coroa Portuguesa. Em virtude deste abandono, a Coroa ordenou que os seus habitantes – nobreza local, soldados, etc – fossem para Lisboa. Aqui chegados, foram reenviados para uma nova missão: a fundação de uma Nova Mazagão, na fronteira Norte do Brasil, no actual estado de Amapá. Era o fim de mais de três séculos de presença portuguesa em Marrocos (1415-1769), em virtude de as possessões norte-africanas serem um sorvedouro de recursos humanos, monetários e bélicos, sem qualquer retorno (à excepção das questões ideológicas, Guerra Santa).

marrocos-2013-469

A antiga fortificação de Mazagão constitui – hoje uma importante atracção turística de Marrocos – um dos melhores exemplos conservados da arquitectura militar do Renascimento fora do Continente Europeu, que resistiu ao teste do tempo e da própria acção humana. De Salientar, que as fortificações portuguesas de Mazagão foram inscritas na lista do Património da Humanidade pela UNESCO em 2004 e, em 2009, como uma das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo. O litoral atlântico de Marrocos oferece-nos uma grande variedade de grandes e pequenas fortificações costeiras com grande impacto visual e plástico, como em nenhum outro lugar. Nas mesmas, podemos encontrar o estilo de fortificar de Diogo de Arruda e dos seus familiares.

panorama-eljadidaescala

Em Conclusão, uma visita ao Norte de África  – Marrocos – não é para um português um mero passeio como qualquer outro.  É uma espécie de regresso a casa. Para quem possua alguns conhecimentos de Geografia e História e tenha o sentido do valor dos passado lusitano, visitar o actual Reino de Marrocos é ir a um dos nossos lugares predilectos, ir afervorar o amor pátrio e retemperar a alma, como afirma Urbano Rodrigues (RODRIGUES, 1935). De facto, diante de património edificado pelos nossos antepassados  em diversas cidades costeiras como Asilah, Tânger, Essaouira, Safi, El Jadida, podemos sentir bem o que fomos e o que podemos ainda ser…

BIBLIOGRAFIA

Carita, Rui, “A arquitectura abaluartada de origem portuguesa”, in Relações luso-marroquinas 230 anos, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, nº 17-18, Lisboa, Instituto Camões, Novembro 2004, pp. 135-138, 143-145.

Correia, Jorge, “Mazagão: A última praça Portuguesa no Norte de África”, in Revista de História da Arte, Lisboa, IHA – FCSH-UNL, nº 4 , 2007, pp. 185-209.

Dias Farinha, António,  “Os Portugueses em Marrocos”, Instituto Camões, Colecção Lazúli, 1999,pp.3-103.

LOPES, David – A Expansão em Marrocos, Colecção Cabo a Cabo, Lisboa: Teorema /O Jornal, 1989.

Moreira, Rafael, “Arquitectura militar do Renascimento”, in História das Fortificações Portuguesas no Mundo, Dir. Rafael Moreira, Lisboa, Pub. Alfa S.A., 1989, pp. 150-157.

RODRIGUES, Urbano – Passeio a Marrocos, Lisboa: Empresa Nacional de Publicidade, 1935.

Nota importante [👤]

As presentes informações não têm natureza vinculativa, funcionam apenas como indicações, dicas e conselhos, e são susceptíveis de alteração a qualquer momento. O Blogue OLIRAF não poderá ser responsabilizado pelos danos ou prejuízos em pessoas e/ou bens daí advenientes. Se quiser partilhar ou divulgar as minhas fotografias, poderá fazê-lo desde que mencione os direitos morais e de autor das mesmas.

linhagraficaALL-oliraf-03

Texto: Rafael Oliveira  | Fotografia: Oliraf Fotografia

Follow me: @oliraffotografia on Instagram | Oliraf Fotografia on Facebook

Fotografia•Viagens•Portugal © OLIRAF (2014)

Contact: oliraf89@gmail.com